Meu público é o leigo!

Tempo de leitura:

Em março do ano passado resolvi fazer do meu site um blog. Pensei em um espaço que pudesse aumentar a relação com os cantores e estimulasse o diálogo sobre o canto coral. Acredito que um ensaio seja um espaço de fazer musical, onde o foco deve ser a música. Entretanto, também acredito que os cantores desejem estender os assuntos para além do ensaio e aprender mais a partir de um olhar crítico.

Incômodos

Pesquisando sobre conteúdo disponível para cantores de coro encontrei pouco material e, o que encontrei, tinha foco no treinamento musical para o ensaio. Não era exatamente o que me incomodava, afinal, o ensaio e as aulas de leitura musical davam conta desta necessidade. O que sentia falta era de mostrar o que eu gosto de ouvir, falar sobre hábitos perniciosos e, principalmente, orientar os cantores sobre a melhor maneira de se portar durante a atividade.
Existe muito material para regentes de coros abordando assuntos complexos, tanto musicais como educativos, psicológicos, filosóficos, administrativos e muitos outros; no entanto, nada foca o cantor, principalmente, o cantor iniciante, aquele que mais precisa de ajuda.

Mercado

Trazendo minhas reflexões para o mercado, percebi uma distorção: meus clientes são os cantores, não faz sentido escrever para regentes que já possuem muito material à disposição.
Analisando mais a fundo, percebi que a maioria das publicações, inclusive as minhas antes de escrever no blog, são acadêmicas. Isso explica o foco dos assuntos na área, afinal, aquele que está se profissionalizando é o público das instituições acadêmicas. E estas instituições são as que mais publicam sobre canto coral no Brasil.
Indo além, percebo que muitas instituições direcionam mais recursos aos grupos mais avançados, quando, na verdade, o iniciante forma a base de formação delas. Não me refiro apenas aos recursos financeiros, mas também à mobilização de pessoas. Este quadro se reflete em muitos cursos profissionalizantes, que reservam os estágios em grupos mais iniciantes aos alunos mais inexperientes. Focando apenas na questão musical, esquecem que o pedagógico é o que mais faz diferença nessas situações. Nesses casos, penso que vale mais um professor licenciado assumir a direção do grupo que um bacharel em regência, que não teve nenhuma orientação pedagógica na formação.
Entre um repertório mais fácil e a capacidade de cantar pode existir uma imensa distância. Costumo dizer que os grupos mais difíceis, na verdade, são os mais limitados. E isso não tem nada a ver com a complexidade do repertório. Logo, são os grupos iniciantes que precisam do regente mais experiente, de preferência, um que possua licenciatura,  de modo a garantir a base de qualidade dos grupos mais avançados sem limitações pedagógicas.
Todo cantor avançado foi um iniciante e precisou ser bem orientado para chegar onde está. O que vejo muito são cantores mal orientados agregando grupos avançados. Vocalmente bons, musicalmente e disciplinarmente péssimos. Quanto ao regente, é necessário que seja igualmente capaz musicalmente e pedagogicamente, do contrário, melhor se preparar um pouco mais para a função.
Daí a minha ideia de distorção do mercado: todos querem ter o melhor grupo, mas muitas estruturas são amadoras e jamais deixarão de sê-lo. A maior parte dos coros do mundo, inclusive coros premiados, são amadores. Sob esse prisma, percebemos que, na verdade, o que segura financeiramente uma instituição são as pessoas que estão dispostas a pagar pelos serviços. Quando se trata de canto coral, a base financeira também está nos grupos iniciantes. O cantor avançado almeja ser profissional, logo, não está disposto a pagar para cantar, mas receber por isso, já o iniciante quer aprender e está disposto a pagar por diversas atividades que ajudem em seu desenvolvimento.
Facultando a posição subalterna aos grupos iniciantes, criam-se dois problemas: falta de base formadora para os grupos avançados e falta de recursos financeiros.

Escrevendo para iniciantes

O motivo pelo qual escrevo em um blog é que iniciantes não têm o hábito de ler, e muitos não possuem tempo (e paciência) para acompanhar um texto cheio de academicismos, afinal, não atuam em coral por profissão, mas por hobbie. Um blog, além de ser mais despreocupado, vai direto ao assunto sem muitos rodeios e deixa espaço para comentários, onde o conhecimento pode avançar e até mesmo contestar o texto da postagem. Um blog não está preocupado com a verdade, mas com o diálogo. Um blog não busca comprovar nada, mas dialogar a respeito.
O blog é um lugar de opinião. A minha, como escritor, e a sua, como leitor. Logo, meu interesse maior está na opinião do leigo, ou a mudança dessa mesma opinião. Os regentes possuem muitos espaços acadêmicos reservados ao diálogo e à própria opinião, mas os cantores não e, mais que os regentes, precisam ser ouvidos, afinal, são os clientes. Criar um espaço de diálogo com cantores é, na verdade, um meio de ouvi-los e de atender aos seus anseios, bem como, mostrar os meus.
O resultado disso interessa a vários regentes, afinal, o público é o mesmo. Por isso, faço um apelo: se todo o regente tivesse um blog, os cantores seriam melhor orientados, mais ouvidos e atendidos. Além disso, os regentes teriam mais informações sobre o que o público deseja, acertando mais no repertório proposto e na maneira de apresentá-lo. Usando esse recurso, provavelmente, a classe seria mais beneficiada. Um blog poderia complementar o outro e, longe de ser a expressão da verdade de cada regente, agir como um espaço de diálogo entre diferentes agrupamentos. Ninguém precisa concordar e, quando se trata de arte, os avanços acontecem justamente na discordância. 
Como o meu público é o leigo, meu interesse é que os cantores leiam. Logo, o texto não pode ser muito longo. Até a próxima postagem!

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